segunda-feira, 24 de março de 2014

Francisco e a mudança na "fábrica de bispos"


Andrea Tornielli, Vatican Insider 12/03/2014

O perfil do bispo foi traçado em dois dos mais importantes discursos do Pontificado: aquele que Francisco pronunciou em junho de 2013 quando recebeu os núncios apostólicos, e aquele que fez, fundamental, em 27 de fevereiro, à Congregação para os Bispos. A estes se pode acrescentar a homilia de 25 de outubro de 2013 por ocasião das primeiras ordenações episcopais que o Papa celebrou. Nos últimos meses, estas indicações foram tomando corpo inclusive em nível operacional dentro da Congregação para os Bispos.

Na entrevista para o Vatican Insider de fevereiro, o cardeal arcebispo de Chicago Francis George, ao falar sobre a eleição do Conclave, disse: “O Conclave é um exercício de liberdade. Em primeiro lugar, a liberdade dos eleitores que devem aprender a libertar-se de qualquer tipo de interesse pessoal ou amizade ou de qualquer outro motivo para a eleição de um candidato que não seja o motivo dado durante o juramento antes do voto (“Quem é o melhor candidato para o trono de Pedro?”). Segundo, a liberdade dos candidatos que devem ser capazes de desempenhar um ministério pastoral universal (um candidato que não seja apenas subjetivamente livre, mas também objetivamente livre de qualquer “bagagem” relacionada às suas origens e ao seu passado...)”.


E este mesmo critério pode ser aplicado ao trabalho dos membros da Congregação para os Bispos, que devem propor ao Papa os nomes dos novos pastores de uma diocese. Não é mistério que há muito tempo existem “trilhos preferenciais”, grupinhos que premiam a proximidade de determinados candidatos a alguns cardeais, além de significativas ingerências, quanto ao caso específico da Itália, por parte da cúpula da Conferência Episcopal da Itália e da Secretaria de Estado. Em alguns casos, as nomeações episcopais para sedes importantes, tanto por sua história como por suas dimensões, se deram mediante a chamada “diretíssima”, isto é, o atalho que permite superar o “trâmite” da Congregação e a discussão entre os cardeais e bispos que a compõem.


Atualmente, certas influências diminuíram notavelmente. Não é nenhum segredo, por exemplo, que o cardeal Pietro Parolin (nomeado pelo Papa como membro da Congregação), ao contrário do que faziam seus predecessores, não quer interferir nas nomeações episcopais (sobretudo italianas), pois também é o secretário de Estado. E também a “diretíssima” e o poder dos grupinhos deveriam diminuir.


As indicações de Francisco, a este respeito, são claríssimas. Os núncios apostólicos, ao escolherem os candidatos ao episcopado, devem assinalar “pastores próximos das pessoas”, que “não sejam ambiciosos” e não aspirem ao posto e que não busquem constantemente, uma vez nomeados, ser promovidos para outra sede mais importante. O bispo ‘casa-se’ com sua Igreja, mas em muitos casos para com facilidade na segunda ou terceira ‘nupcia’.


“Os candidatos devem ser pastores próximos das pessoas: padres e irmãos, que sejam mansos, pacientes e misericordiosos”, pediu Francisco, convidando a deixar que os doutos se dediquem à pesquisa e ao ensino. Os candidatos ao episcopado devem amar “a pobreza, interior como liberdade pelo Senhor, e exterior, como simplicidade e austeridade de vida”, em vez de ter uma “psicologia de ‘príncipes’”. “Que não sejam ambiciosos – disse o Pontífice aos núncios –, que não busquem o episcopado e que sejam esposos de uma Igreja, sem que estejam buscando constantemente outra”.


Os bispos devem “servir” e não “dominar”. Devem ser, sobretudo, pais para seus sacerdotes, devem estar sempre dispostos a recebê-los. Além disso, devem estar próximos dos “pobres, dos indefesos e de quantos precisarem de acolhida e de ajuda”.


O Papa Francisco também escreveu à Congregação, também chamada de “fábrica de bispos”, em fevereiro e pediu-lhes que se assegurassem de que “o nome de quem foi escolhido seja, acima de tudo, pronunciado pelo Senhor”. “O Santo Povo de Deus segue falando – disse Francisco – e necessitamos de alguém que nos veja com a grandeza do coração de Deus. Não precisamos de um dirigente, de um administrador de empresa, e muito menos de alguém que esteja ao nível das nossas deficiências ou pequenas pretensões”. O papa convidou para avaliar as candidaturas sem perder de vista as necessidades das Igrejas particulares, porque “não existe um pastor padrão para todas as Igrejas”. Também convidou os membros da Congregação para elevarem-se “além das nossas eventuais preferências, simpatias, pertenças ou tendências”.


Os critérios desta eleição devem nascer da origem, da Igreja apostólica. O bispo deve ser “aquele que sabe atualizar tudo o que aconteceu a Jesus, e, sobretudo, aquele que sabe, junto com a Igreja, fazer-se testemunha da sua ressurreição”.


A tradução é de André Langer.


Fonte: Instituto Humanitas Unisinos - Notícias - Quinta-feira, 13 de março de 2014